De um navio, avião ou praia, o oceano pode parecer bem plano e uniforme. Mas, na realidade, a água do oceano se acumula em picos e vales, de maneira que o nível do mar fica mais elevado em algumas margens oceânicas do que em outras. A superfície do oceano sobe e desce naturalmente, variando de 2 a 3 metros em alguns lugares.
Os pesquisadores também sabem que o nível geral do mar está subindo em todo o mundo, e mais em alguns lugares do que em outros. Eles estimam que nos últimos 140 anos, o nível médio global do mar aumentou de 21 a 24 centímetros.
Há muitas razões pelas quais a superfície do oceano é irregular. O atrito entre os ventos e a água faz com que as ondas se acumulem. A força da gravidade da Lua e do Sol faz com que as marés subam e desçam. A rotação da Terra e o fluxo das correntes marinhas causam oscilações na superfície. A pressão atmosférica pode exercer maior ou menor força e com isso alterar a rugosidade no topo da coluna d’água. Até mesmo continentes, ilhas e montes submarinos exercem um puxão gravitacional que atrai a água ao seu redor e ocasionam perturbações altimétricas na superfície do mar.

Sabemos também que a água do mar com diferentes temperaturas e salinidades pode ser mais ou menos densa, preenchendo mais ou menos volume. Por exemplo, os pesquisadores há décadas já constataram que o nível do mar é geralmente mais alto no oceano Pacífico do que no Atlântico – cerca de 20 centímetros – porque as águas do Pacífico são geralmente mais quentes e menos salgadas, portanto menos densas, do que as do Atlântico.
As correntes marinhas superficiais mais intensas transportam grande quantidade de massa e energia e, geralmente, possuem águas com temperatura e salinidade diferentes das massas de águas adjacentes. Nas figuras abaixo podemos ver o fluxo da Corrente das Agulhas contornando a porção sul do continente africano, e como ela modula a altura da superfície do mar nesta região.

Nas regiões onde as correntes oceânicas superficiais são intensas, a amplitude de variação do nível do mar tende a ser maior e mais dinâmica do que nas regiões onde as correntes são menos intensas, conforme podemos observar nas figuras abaixo.

Essas informações são conhecidas porque podemos medi-las. Por mais de quatro décadas, grupos de pesquisas fazem uso de instrumentos a bordo de satélites, conhecidos como radares altimétricos, para monitorar a topografia da superfície do oceano – a forma e a altura dos picos e vales do oceano. Os radares altimétricos, ou altímetros, enviam repetidamente pulsos de radiação eletromagnética de microondas que interagem com a superfície do mar e são refletidas de volta para o satélite. O instrumento calcula o tempo que leva para o sinal retornar, enquanto também rastreia a localização precisa do satélite no espaço. A partir disso, é possível derivar a altura da superfície do mar na região que está imediatamente abaixo da órbita do satélite.

Muito antes de haver satélites, medidores de maré (marégrafos) montados em baías e portos costeiros mediam a altura do mar. Coletados em diversos lugares desde o início do século 19, esses registros forneceram uma maneira de detectar mudanças no oceano costeiro. Mas como as massas de terra e ilhas são distribuídas de forma desigual pelo mundo, e os marégrafos tendem a se agrupar nas costas dos países mais ricos, há uma certa limitação nesse tipo de medida. Ainda assim, os marégrafos fornecem uma valiosa fonte de medidas para averiguar e complementar os dados coletados pelos satélites altimétricos. O Serviço de Monitoramento do Nível Médio do Mar (PSMSL) já compilou e analisou mais de 1500 marégrafos posicionados ao redor do globo (https://www.psmsl.org/).

Desde 1992, cinco missões espaciais dedicacas à altimetria usaram instrumentos muito semelhantes: TOPEX/Poseidon (1992-2006), Jason-1 (2001-2013), Jason-2 (2008-2019), Jason-3 (2016 até o presente) e Jason-CS (lançado em 2020). Os satélites altimétricos foram construídos por meio de parcerias internacionais, como a Agência Espacial Americana (NASA) e a Agência Espacial Européia (ESA) entre outros.

Essas missões fornecem um registro unificado da topografia da superfície do mar com cobertura espacial equivalente a meio milhão de medidores de maré. Previsto para ser lançado em 2022, o satélite altimétrico SWOT (Surface Water and Ocean Topography, https://swot.jpl.nasa.gov/) vem para complementar essas medidas altimétricas tradicionais e também para estabelecer um novo paradigma no processo de amostragem de dados altimétricos.
O mapa abaixo mostra as tendências globais do nível do mar em todo o mundo, observadas durante o período de 1993 a 2020 pela constelação de satélites altimétricos. Há variações espaciais na taxa de aumento do nível do mar, com algumas partes do oceano subindo mais rápido (representado em vermelho e laranja escuro) do que a taxa média global.

Identificar alguns milímetros de mudança em meio à agitação dinâmica do oceano é um desafio. O satélite tem que olhar para baixo através de 1300 quilômetros de atmosfera. Embora as nuvens não sejam um problema para o radar altimétrico – que penetra na cobertura de nuvens – a quantidade de umidade no ar diminui a velocidade do pulso de microondas emitido pelo altímetro e pode fazer o oceano parecer mais alto ou mais baixo do que realmente é. Para compensar isso, os engenheiros acoplam instrumentos nos satélites altimétricos para medir, entre outros parâmetros, o vapor de água e corrigir seus efeitos.
Mesmo quando todas as variáveis na medição do nível do mar são contabilizadas, o planeta oferece mais complicações: padrões sazonais e ritmos da superfície do mar que podem durar anos e décadas. Por exemplo, padrões climáticos como El Niño e La Niña (https://olharoceanografico.com/el-nino-e-la-nina-os-extremos-do-clima/) fazem com que a água aqueça ou esfrie, suba e desça e escorra pelas bacias oceânicas. Por exemplo, a figura a seguir mostra a evolução do nível médio global do mar considerando os padrões sazonais que ocorrem no oceano (curva azul) e após remoção desses padrões sazonais (curva laranja).

Ao analisar os dados da superfície do mar por longos períodos e observar a ocorrência de grandes eventos como o El Niño, os pesquisadores podem identificar e remover os ciclos naturais para detectar as mudanças comparativamente pequenas no nível geral do mar e que estão associadas às mudanças climáticas de longo prazo. É por isso que os radares altimétricos tem importância fundamental no monitoramento dos oceanos: eles acumularam um registro de dados que é mais longo do que os ciclos sazonais, anuais e até decadais.
O que descobriu-se com a análise dos dados altimétricos, é que o nível médio global do mar subiu um total de 9,5 centímetros desde que o satélite TOPEX-Poseidon entrou em atividade em 1992. E a taxa está acelerando. Ao longo do século 20, o nível do mar subiu a uma taxa de cerca de 1,5 mm por ano; no início da década de 1990, a taxa era próxima de 2,5 mm por ano. Nos últimos 30 anos, a taxa média aumentou para 3,51 mm por ano.
Embora alguns milímetros de água a mais possam parecer pequenos, estima-se que cada 2,5 centímetros de elevação do nível do mar se traduz em 2,5 metros de praia perdida ao longo de nossas costas. Isso também significa que as marés altas e as tempestades podem aumentar ainda mais, trazendo mais inundações costeiras, mesmo em dias ensolarados. Algumas estimativas sugerem que os mares podem subir mais 65 centímetros até o ano 2100 se as camadas de gelo e geleiras da Terra continuarem derretendo e as águas oceânicas continuarem aquecendo.

Traduzido e adaptado por: Eduardo Negri, Prof. do Depto de Oceanografia Física da FAOC/UERJ.
Referências Bibliográficas
Making a Measure of Sea Level Rise: Ocean Altimetry (https://earthobservatory.nasa.gov/images/147435/taking-a-measure-of-sea-level-rise-ocean-altimetry )