Responsável pelo transporte e equilíbrio térmico entre as águas do Atlântico Norte e os trópicos, a Corrente do Golfo pode estar prestes a entrar em colapso.
“Esse fluxo de águas marítimas quentes superficiais e frias mergulhantes pelo Oceano Atlântico é fundamental para a manutenção do clima no planeta — e o eventual colapso desse sistema teria consequências graves e imprevisíveis, como ondas de calor ou frio e alterações nos regimes de chuva” segundo artigo publicado em 11/08/2023 pela BBC News.
Mas o que exatamente esse colapso pode resultar?
Vamos primeiro entender como ela funciona nas condições atuais.
A Corrente do Golfo é um ramo de um complexo sistema conhecido como Circulação Meridional de Capotamento do Atlântico, ou AMOC na sigla em inglês.
Em resumo, esse fluxo gigantesco de águas oceânicas é dividido em duas etapas:
A primeira ocorre no Atlântico Sul, entre a América do Sul e a África. Por ser uma região mais próxima a linha do equador e ter uma incidência solar mais intensa, as águas superficiais tornam-se mais quentes e graças a um regime de ventos típicos da região, essas águas mais quentes são transportadas para o Atlântico Norte até que se aproximem da Groelândia e do Ártico.
Na medida que as águas superficiais do mar se aproximam de regiões mais frias e de clima mais seco ocorre o resfriamento da massa d’agua. Essas tendem a congelar e expulsam o sal da parte líquida. Portanto, se tornam uma água mais salina e mais gelada, sendo assim mais densa e pesada. Nessa situação, as águas superficiais, se tornando mais densas, tendem a submergir para o fundo oceânico. Para essa integração das águas superficiais que mergulham para águas profundas, vem a expressão capotamento, dar volta sobre si mesmo.
Ao longo de anos isso se tornou um ciclo, fazendo um balanceamento entre as águas quentes dos trópicos e as frias do Ártico resultando em um equilíbrio climático para todo o planeta.
Conforme as temperaturas no planeta tendem a aumentar com o aquecimento global, as geleiras do Ártico e da Groelândia tendem a derreter. As águas frias oriundas do degelo influenciam diretamente no resfriamento das massas d’águas, além de interferir na salinidade da água, resultando no desbalanceamento da densidade das águas superficiais.
“Nas últimas duas décadas, cientistas detectaram alterações da temperatura média na Groenlândia e no Ártico (…), mas o assunto voltou à tona com a publicação de um artigo da Universidade de Copenhague, na Dinamarca, no periódico Nature Communications. Por meio de uma série de cálculos estatísticos, os autores estimam que o colapso da Amoc poderia ocorrer ainda neste século, se as emissões de CO2 continuarem no ritmo atual.” Segundo a BBC News este artigo escrito por Peter Ditlevsen e Susanne Ditlevsen, explica o enfraquecimento da corrente do Golfo provocado pelo desbalanceamento das densidades nas massas d’água ao longo do seu trajeto. Esse desbalanceamento pode acarretar alteração do percurso das correntes quentes superficiais da Corrente do Golfo, podendo inclusive provocar seu afundamento antes de atingir pontos mais ao norte do Atlântico Norte. Nesse cenário, países de latitudes mais elevadas podem não receber essas águas aquecidas e terem as suas águas congeladas por períodos maiores, principalmente no inverno.
A paralisação da AMOC, poderia gerar uma série de cataclismas súbitos e inesperados, como tsunamis, furacões, ondas de calor e de frio, por exemplo, bem como o congelamento das águas costeiras do Reino Unido e países nórdigos durante o inverno.
As ações humanas realizadas de modo inconsequente e sem atenção aos efeitos colaterais adversos podem desencadear desequilíbrios ambientais de envergadura planetária. A humanidade com mais de 8 bilhões de habitantes já é capaz de mudar o equilíbrio dos ciclos naturais conquistados ao longo de milhões de anos. As correntes oceânicas que distribuem o calor já sofrem alterações do seu perfil de circulação devido ao efeito estufa oriundo da queima dos combustíveis fósseis. Se a humanidade não promover a transição do seu modelo energético contemplando matrizes renováveis como a solar e a eólica, o planeta vai reagir de forma adversa inviabilizando a sobrevivência do homem em muitas regiões do planeta.
Embora a questão do desequilíbrio da Corrente do Golfo tenha sido recebida com ceticismo por alguns da comunidade acadêmica, temos acompanhado e vivenciado acontecimentos trágicos, oriundos das mudanças climáticas em que nos encontramos. Nós que acompanhamos as transformações catastróficas, crédulos do aquecimento global e de suas consequências, precisamos estar atentos aos sinais que o planeta nos dá e conscientizar a população leiga a respeito dos perigos da emissão de CO2 na atmosfera.
Autora: Leticia Silva Guimarães
Referência Bibliográfica:
https://www.bbc.com/portuguese/articles/cy0pmezpd2xo
DITLEVSEN PETER, DITLEVSEN SUSANNE. Warning of a forthcoming collapse of the
Atlantic meridional overturning circulation. Nature Communications, Institute of Mathematical Sciences, University of Copenhagen, Copenhagen, Denmark. N. 4254 – 25 july 2023. Disponível em: https://www.nature.com/articles/s41467-023-39810-w