Rios e esgoto em Botafogo

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O Rio de Janeiro se despediu dos Jogos Olímpicos de 2016 e se prepara para receber os Jogos Paralímpicos. Durante os preparativos um dos assuntos mais discutidos foi a poluição na Baía da Guanabara e os possíveis efeitos sobre o iatismo e os atletas. No dia 21/08/2016, no entanto, um vídeo foi publicado nas redes sociais mostrando esgoto sendo jogado na enseada de Botafogo.

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Figura 1: Cancela liberando esgoto na enseada de Botafogo. Fonte: Fanpage da Associação de Moradores e Amigos de Botafogo.

Como essa água vai parar aí e porque ela é desse jeito? A resposta para esta pergunta passa pela história do bairro. Como toda a cidade do Rio de Janeiro, o bairro de Botafogo possui rios canalizados, sendo os principais o Rio Berquó e o Rio Banana Podre. Na figura abaixo podemos observar o curso aproximado desses rios em 1565, quando a cidade foi fundada:

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Figura 2: Cursos dos rios Berquó e Banana Podre em 1565. Fonte: RRA Arquitetura.

A partir do século XIX a princesa Carlota Joaquina passou a viver no bairro e com isso começou uma ocupação mais efetiva. No começo do século, ambos os rios foram canalizados (passaram a correr em canais de concreto subterrâneos) por ordem do prefeito Pereira Passos, mas continuavam a desaguar na praia. Em 1967, porém, foi construída uma galeria de cintura (galeria que recolhe água proveniente de drenagem pluvial e rios canalizados) na praia de Botafogo que desviou o desague do rio Banana Podre e o conduziu até o lado direito da enseada de Botafogo. Na figura seguinte podemos ver os cursos de ambos os rios e, em vermelho, a galeria de cintura subterrânea, embaixo da Avenida das Nações Unidas:

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Figura 3: cursos atuais dos rios Berquó e Banana Podre. Fonte: Plano Municipal de Saneamento Básico da Cidade do Rio de Janeiro.

Outra tubulação que passa pelas ruas do bairro é a drenagem, responsável por guiar as águas pluviais até o deságue final. Em uma certa altura, as águas das duas proveniências se misturam. Mas se a água é de origem pluvial, porque ela chega na Baía com características tão desagradáveis?

A resposta se encontra no caminho que ele passa. A água da chuva carrega partículas de poeira e outras partículas na atmosfera, assim como outras depositadas sobre as superfícies. Durante o caminho a água pluvial também recebe lixo e esgoto clandestino, degradando ainda mais as suas características. O Rio Berquó, por passar debaixo do cemitério São João Batista, recebe necrochorume devido à infiltração em suas galerias.

As comportas no deságue tem como objetivo evitar que os rios infestem a Baía com sujeira, mas só funcionam quando o tempo está seco, conduzindo as águas para o emissário de Ipanema. Quando chove, como é o caso dos dias que antecederam a abertura das comportas na praia de Botafogo, as comportas são abertas, e a circulação de água no local não é suficiente para afastar a sujeira.

Durante o período seco a galeria de águas pluviais recebe uma contribuição significativa de esgoto fugitivo além de toda sorte de detritos urbanos produzidos pelo adensamento populacional e a carência de manutenção e expansão da rede de esgotos que teoricamente deveria crescer a medida que bairros como Botafogo, Humaitá, Laranjeiras, Cosme Velho e Flamengo crescem. Assim, toda poluição urbana acumulada na galeria de águas pluviais é varrida com as chuvas torrenciais e levada para a enseada de Botafogo, uma vez que nestas situações é interrompido o bombeamento das águas para o Emissário de Ipanema.

Nestes episódios é que percebemos a falta que faz um sistema independente de tratamento das águas poluídas que são conduzidas pelos antigos rios Berquó e Banana Podre, hoje totalmente canalizados servindo apenas como condutores de águas urbanas servidas. A instalação de uma Unidade de Tratamento de Rios-UTR na embocadura dos rios, sob a sede náutica de Botafogo, resolveria o problema definitivamente. O problema é que o poder público não quer ficar responsável pela manutenção e tratamento das águas poluídas preferindo entregar para que a natureza resolva ou absorva a poluição gerada. Neste caso o prejuízo é de todos.

Escrito por Carolina Ramos Regis/ Editado por Gabriela Brandão Barros Lima

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6 Replies to “Rios e esgoto em Botafogo”

  1. Boa noite!
    Sou aluna de Arquitetura e Urbanismo da PUC, e estou realizando meu projeto de conclusão de curso na área da enseada de Botafogo. O projeto é utópico urbano-paisagístico e consiste na criação de um parque costeiro e uma marina pública ao longo da orla. Além da maior permeabilização da área, eu estava pensando na possibilidade da recuperação dos rios originais existentes de forma a desenvolver o espaço público e ampliar a coleta de água pluvial, para que se diminua inundações e as comportas não precisem ser abertas desaguando na baía. Como sou leiga no assunto, gostaria de uma opinião profissional sobre essa possibilidade, ou outras alternativas de infraestrutura verde que possam ajudar.
    Agradeço desde já!
    Att,
    Luísa Ellery

    1. Oi Luisa, tudo bem?
      Obrigada por ler o nosso blog! Comentários como o seu são a certeza que o nosso trabalho está no caminho certo. Então, a renaturalização dos rios de Botafogo passa por um problema grande: as edificações do bairro. O rio Berquó, por exemplo, passa por debaixo do cemitério São João Batista. Para renaturalizar esse rio seria necessário remover o cemitério e tirar a Rua General Polidoro, enquanto que para o rio Banana Podre seria necessário remover uma série de ruas e casas, enfim.
      O que eu sugiro a você é ver como seria possível aumentar a infraestrutura de drenagem urbana através do redimensionamento das galerias e recuperar o desague desses rios através da utilização de unidades de tratamento de rios (UTR’s), como é o caso do Rio Irajá e do piscinão de Ramos. Acho que a sua proposta de um parque costeiro e marina publica passaria por UTR’s, incentivo ao aumento das áreas verdes e diminuição da impermeabilização dos bairros através de criação de maiores áreas de infiltração nas edificações, e readaptar as estruturas do Clube Botafogo para receber uma Marina.
      As águas pluviais urbanas são extremamente contaminadas com sujidades urbanas de toda ordem, inclusive produtos químicos (óleos e graxas) e partículas microscópicas com tempo de degradação natural muito longa. Assim equipamentos de tratamento e segregação de poluentes das águas pluviais devem ser considerados. Cidades sustentáveis modernas não devem prescindir destas inovações. Estas podem ser de natureza passiva (infraestrutura verde) ou ativa (UTR’s) em função do volume e tipo de poluente predominante de cada mancha urbana.

  2. Precionar autoridades para não permitir o despejo de esgoto na praia de Botafogo que derramado todos os dias a partir das 21hs que pude constar pessoalmente no dia 23/10/2017.Grato

  3. Olá, sou aluna da PUC-Rio e estou com projeto de monografia sobre a bacia de Botafogo, gostaria muito de obter as informações como as que foram publicadas, poderiam me ajudar?

  4. Gostaria de um contato para mais informações referentes a matéria.

  5. Bom dia! Sabem de alguma maneira que eu possa acessar as duas imagens disponibilizadas no artigo, em uma resolução melhor? Está de difícil leitura. Obrigada!

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