David Zee
Conviver em harmonia com os recursos vivos dos oceanos ou ter uma relação predatória? Eis a grande contradição humana a ser resolvida nas próximas décadas com o risco eminente da perda deste enorme potencial marinho. Tal como uma charada, este desafio só será solucionado com participação e decisão da sociedade. Grande parte vai depender da difusão do conhecimento a ser produzido pela ciência e de investimentos na pesquisa. A participação da sociedade se dará através do acesso à informação para promover uma opinião pública clara e coesa.
Você sabia que a captura mundial do pescado atingiu seu ápice na década de 90? A partir daí só tem decrescido em termos de volume capturado ano após ano. Tal estatística indica que o homem já ultrapassou o limite da capacidade natural de reposição dos estoques pesqueiros, passível de ser realizado pela natureza. A continuar nesta escalada, a tendência é da depleção dos elementos naturais que suportam a cadeia alimentar dos oceanos. A redução drástica de determinadas espécies de pescado pode desencadear um efeito cascata de desagregação da teia alimentar, redundando num desequilíbrio ambiental sem volta em muitos ambientes marinhos onde a pesca ainda é praticada. Isso representa um oceano mais frágil e pobre em termos de biodiversidade e produtividade pesqueira.
A sociedade precisa estar esclarecida e alerta sobre os perigos advindos de dois métodos nocivos de pesca. Um praticado em países desenvolvidos, por poucas empresas pesqueiras, numa escala absurda e em alto mar que é a SOBREPESCA. Outro que é praticado por países subdesenvolvidos numa escala menor, mas pulverizada por inúmeros pescadores artesanais e ao longo do litoral que é a PESCA PREDATÓRIA. A seguir vamos entender os impactos causados pelas diferentes estratégias de pesca adotadas.
A Sobrepesca se implantou devido ao rápido desenvolvimento tecnológico de equipamentos como sonares de detecção, aparelhos de posicionamento e de telecomunicação, além da construção de navios moderníssimos que tem capacidade de navegar durante meses a fio em alto mar, atingindo os mais distantes pontos de todos os oceanos. Esses navios são verdadeiras indústrias flutuantes de pescado e sua eficácia de captura é uma ameaça à sobrevivência e a capacidade de reprodução e de reposição das espécies de valor econômico. A facilidade com que se consegue acessar diferentes locais do planeta e a sua logística de processamento do pescado capturado potencializa a eficácia da produção. Nessas condições enormes cardumes em alto mar são facilmente retirados por redes pela popa do navio e o produto sai limpo, embalado, congelado e estocado nos porões da mesma embarcação. Dessa forma é possível perceber a imensa capacidade de retirada de peixes de locais onde nem ao menos existem estudos para se conhecer a sua capacidade de reposição dentro da velocidade de captura realizada por essas embarcações de alta tecnologia.
A enorme logística da indústria de pesca dos países desenvolvidos que conseguem compactar todas as etapas de produção do pescado em alto mar (captura, preparo, embalamento, armazenamento, transporte e distribuição) além da acessibilidade das embarcações em locais distantes da costa constitui uma eficácia produtiva sem limites. Por outro lado, os recursos marinhos têm limitações reconhecidas e inúmeras outras ainda desconhecidas. Uma vez que, convenientemente ainda pouco se conhece sobre o mar, o avanço dessas embarcações em regiões onde os estoques pesqueiros ainda não foram estudados e diagnosticados constitui uma real ameaça à perenidade desses recursos vivos. Além disso, a dificuldade de controlar e de fiscalizar esses locais longe da costa possibilita a prática da pesca ilegal em mar territorial de países diferentes das da bandeira do navio pesqueiro está cada vez mais frequente. Trata-se de uma enorme falta de responsabilidade e descaso com os recursos finitos de um oceano que precisou de milhões de anos para atingir o estágio de equilíbrio ambiental existente. Permitir esse método de pesca sem estudos específicos que comprovem a capacidade de suporte dos oceanos em sustentar esse tipo de prática constitui cumplicidade para esse tipo de crime ambiental. Países como a China, Taiwan, Espanha, Japão e Coréia do Sul concentram 85% da frota pesqueira mundial. É preciso exigir estudos e pesquisa científica que comprovem a sustentabilidade desse tipo de pesca para cada região específica onde é praticado.
A Pesca Predatória apesar de ser realizada por pescadores artesanais em pequena escala, esta é pulverizada em ecossistemas costeiros frágeis e sensíveis. O problema da pesca predatória reside na falta de tecnologia e de equipamentos que evitem os efeitos colaterais indesejados. A falta de recursos e de técnicas adequadas, apesar da sua reduzida capacidade de captura, promove a morte de organismos juvenis e mesmo a destruição de habitats costeiros onde a reprodução se processa. O arrasto com redes de malha muito reduzida sobre o leito de estuários e lagunas além de capturar espécies sem valor comercial destroem berçários da vida marinha. A pesca predatória é um problema afeto principalmente aos países pobres e subdesenvolvidos ou em desenvolvimento.
Outro tipo de pesca predatória é a pesca com bombas que dizimam importantes espécies da cadeia alimentar. Esta se processa com o lançamento de bombas dentro de garrafas de vidro em águas costeiras que e ao explodirem propagam ondas de choque na coluna d’água atordoando e matando os peixes de forma indiscriminada.
A pesca incidental onde golfinhos, tartarugas, focas, aves marinhas e mesmo baleias que são mortas acidentalmente nas redes sem comportas de fuga para esses mamíferos aquáticos e quelônios marinhos é também objeto de muita preocupação. A fiscalização e principalmente a orientação além de meios para apoiar os pescadores na boa prática da pesca sustentável deve ser objetiva de órgãos governamentais de proteção ambiental para erradicar esse tipo de efeito colateral negativo da pesca.
A polemica da pesca só deixará de ser uma pedra no sapato se houver consciência da sociedade para pressionar órgãos competentes para fiscalizar, controlar, orientar e apoiar as boas práticas da pesca. Investimentos em pesquisa e desenvolvimento de equipamentos e técnicas bem como apoiar as comunidades de pesca artesanal devem ser estimuladas para preservar a produtividade pesqueira dos oceanos. Da mesma forma para atender a demanda crescente do consumo de pescado a aquacultura responsável e controlada pode ser uma importante ferramenta e alternativa.
Se você se interessou pelo post, tem interesse em saber mais sobre este assunto e também ajudar o Olhar Oceanográfico, temos abaixo a indicação de livros . É só fazer suas compras na Amazon através do nosso link de afiliado.
https://amzn.to/3av2Mby / https://amzn.to/3nkFtqp
É só acessar e comprar, e você ajuda a divulgação científica da oceanografia!