Atualmente, grande parte da população mundial habita nas zonas costeiras que corresponde a uma faixa de largura de até 60 km da linha de costa. Apesar dessas regiões corresponderem a um espaço menor que 10% em todo o mundo, possuem uma densidade populacional cerca de três vezes maior que a média mundial. As cidades costeiras no Brasil abrigam cerca de 60% do total da população, podendo aumentar ainda mais nas próximas décadas.
Nos novos cenários de mudanças climáticas, há uma maior exposição das cidades costeiras em relação a diferentes fatores climáticos como ondas de ressacas, ventos intensos, aumento do nível do mar relacionados às chuvas volumosas, frentes frias (marés meteorológicas) e maresias.
As ressacas estão entre um dos principais efeitos instantâneos das mudanças climáticas, tendendo a ser mais intensas e frequentes devido ao cenário de ocorrência das mesmas por toda a extensão de uma orla costeira densamente povoada.
Quando há a conjugação da maré astronômica de sizígia (cenários de Lua cheia ou nova) com a maré meteorológica (ventos empurrando e empilhando a água do mar contra o litoral) ocasiona um aumento exagerado do nível do mar. Tal situação facilita o maior acesso das ondas destrutivas sobre as edificações postadas na linha de costa, além de promover a erosão da praia. Este espraiamento maior leva areia, água salgada e lixo para o calçadão e prejudica a funcionalidade urbana. Isto sem falar das praias que ficam inaproveitáveis pela falta de limpeza e contaminação.
A partir do início deste século, o padrão de entrada de frentes frias no Rio de Janeiro vem sofrendo transformações. Antes, de maneira geral, as frentes frias vinham de sudoeste. Contudo, nos últimos anos, esta vem percorrendo trajetórias diferentes vindo de sul e sudeste alterando de forma súbita os trechos de praia atingidos. Esta mudança de pista faz com que as ondas possam ser mais agressivas caso estejam sendo formadas mais próximas do litoral e ao se propagarem, avancem sobre a costa fluminense atingindo diferentes pontos do litoral.
A composição geológica e o relevo do litoral também são elementos importantes para classificar a sua vulnerabilidade. Um litoral composto por rochedos é muito mais resistente do que uma praia formada por sedimentos finos (areia). Assim como um litoral raso e plano é mais vulnerável do que um litoral íngreme.
O risco de acidentes ambientais é proporcional à intensidade das ameaças ressaca, ventanias e chuvas), multiplicado pela vulnerabilidade do litoral e pela sua exposição. Graficamente falando, a grandeza do risco é proporcional à área do triângulo formado pela ameaça, vulnerabilidade e exposição.
Se conseguirmos anular qualquer lado deste triângulo, a área será zerada e o risco desaparece. Assim, se for possível não expor a edificação ao ataque da ameaça, não há risco de qualquer acidente ambiental. Quanto mais conseguirmos reduzir os lados do triângulo e, neste caso, se afastarmos a linha d’água das obras urbanas, menor será o risco.
Todo evento extremo no litoral reclama a areia que foi acumulada e reservada para dissipar a energia da mesma nestes momentos. Alguns elementos naturais do litoral como a trama das raízes da vegetação de praia ajudam a reter a areia contra as perdas provocadas pela erosão dos ventos e mesmo dar mais consistência ao solo contra a desagregação provocada pelas águas. A vegetação da praia somada com a preservação das dunas, evitando-se construir sobre elas, promove assim uma praia mais resiliente contra o ataque das ressacas que tendem a piorar nos próximos anos.
Investimentos urgentes em monitoramento e no desenvolvimento de iniciativas inovadoras devem ser realizados para evitar novas tragédias no futuro. A parceria entre o poder público, iniciativa privada e universidades visando desenvolver tecnologias aplicadas para auxiliar na fixação segura das cidades no litoral devem ser estimuladas. O treinamento de procedimentos e a disseminação de informações para a sociedade, promovendo a sua orientação e participação nas medidas de contingência para a sua segurança e mobilização, devem ser implementadas.
Em situações de áreas costeiras densamente ocupadas e com estreitas faixas de praia frente à erosão do mar e a pressão de uso do solo urbano, torna-se importante assegurar a resiliência do litoral através da engorda da praia. Este alargamento artificial da praia, como foi realizado na década de 1970 em Copacabana, proporcionou uma estabilidade adicional à orla. Assim, a engorda de praia, quando bem dimensionada e conduzida, traz inúmeros benefícios para a defesa do litoral.
Escrito por: Rafael Dias Gomes de Carvalho
Referências bibliográficas
DIAS, J. A.; CARMO, J. A.; POLETTE, M. As zonas costeiras no contexto dos recursos marinhos. Revista de Gestão Costeira Integrada, Lisboa, v. 9, n. 1, p. 3-5, 2009.
MARENGO, J. A.; SCARANO, F. R. (Eds.). Impacto, vulnerabilidade e adaptação das cidades costeiras brasileiras às mudanças climáticas: relatório especial do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas. Rio de Janeiro: PBMC / COPPE-UFRJ, 2016. 184 p.