Durante a XXXI Semana Nacional de Oceanografia tivemos a oportunidade de participar do minicurso de “Métodos de Conservação de Tartarugas Marinhas e suas Aplicações em Projetos Socioambientais” que disponibilizou aula de campo em Sabiaguaba, onde existe o projeto “Programa Verde Luz de Gestão Ambiental Sustentável”. Venha passear de drone pela região.
As tartarugas marinhas são répteis da ordem Testudinata, que por apresentarem características peculiares como a fisiologia influenciada pela temperatura ambiente logo são animais ectodérmicos e, o fato de sua nidação sempre ocorrer numa mesma temporada reprodutiva, são apelidadas por sentinelas dos mares, animais capazes de detectar alterações no ambiente aquático e até mesmo mudanças climáticas.
Também conhecidas como engenheiras dos mares já que desempenham importante papel ecológico nos ambientes que habitam, desde áreas costeiras até regiões abissais nas grandes profundidades oceânicas: são essenciais para o equilíbrio da cadeia ecológica marinha pois milhares de filhotes eclodem por ciclo reprodutivo e apenas um ou dois atingem a fase adulta. Nesta fase servem de alimento para tubarões e, na fase jovem para caranguejos, polvos, répteis, aves e pequenos mamíferos. Outros organismos utilizam seu casco como moradia, por exemplo as cracas e fitoplânctons.
Além disso tudo, as tartarugas são controladoras de populações de águas-vivas, corais, pequenos peixes e algas. Isso mesmo, são um dos poucos animais que se alimentam de águas-vivas. Você já imaginou como ficariam as praias se todas as tartarugas fossem extintas? Estariam superpovoadas por águas-vivas, o que tornaria o banho de mar impossível para os seres humanos.
Como as tartarugas usam muito a visão para obter alimento, num planeta em que os oceanos contêm milhões de toneladas de plástico, a chance delas se confundirem e acabarem morrendo é muito alta. São vários os relatos de tartarugas encontradas mortas com plástico no trato digestivo.
No Brasil podemos encontrar 5 espécies de tartarugas marinhas, todas ameaçadas de extinção: tartaruga-cabeçuda (Caretta caretta), tartaruga-de-pente (Eretmochelys imbricata), tartaruga-verde (Chelonia mydas), tartaruga-oliva (Lepidochelys olivacea) e tartaruga-de-couro (Dermochelys coriacea). Verifique aqui essas 5 espécies.
Tartaruga-cabeçuda ou Tartaruga-mestiça (Caretta caretta)
Habitat variável ao longo do ciclo de vida. Os filhotes e juvenis vivem em alto-mar; os adultos em áreas de alimentação situadas a profundidades entre 25 e 50m. No Brasil, as áreas prioritárias de desova estão localizadas no Espírito Santo, Bahia, Sergipe e litoral norte do Rio de Janeiro.
Tartaruga-de-pente ou Tartaruga-legítima (Eretmochelys imbricata)
É considerada a mais tropical de todas as tartarugas marinhas e está distribuída entre mares tropicais e por vezes sub-tropicais dos oceanos Atlântico, Índico e Pacífico. Desova no litoral norte da Bahia e Sergipe; e no litoral sul do Rio Grande do Norte. Ajuda a manter a biodiversidade nos recifes de corais, pois pode se alimentar seletivamente de alguns grupos de esponjas.
Tartaruga-verde ou Tartaruga-aruanã (Chelonia mydas)
Habitualmente é encontrada em águas costeiras com muita vegetação, chamadas áreas de forrageio, ilhas ou baías onde fica protegida, sendo raramente avistada em alto-mar. As áreas de desova no Brasil são as Ilhas oceânicas de Trindade, Reserva Biológica do Atol das Rocas e Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha. É um mega-herbívoro marinho que consome toneladas de algas e grama marinha.
Tartaruga-oliva (Lepidochelys olivácea)
Esta espécie habita principalmente águas rasas e também pode ser encontrada em mar aberto. A área de desova está localizada desde o sul de Alagoas, passando por Sergipe, até o litoral norte da Bahia.
Tartaruga-de-couro ou tartaruga-gigante (Dermochelys coriácea)
Vive na zona oceânica durante a maior parte da vida e a única área regular de desova conhecida no Brasil situa-se no litoral norte do Espírito Santo. Desempenha papel fundamental no controle das grandes populações de águas-vivas do Atlântico, sendo um dos principais predadores de águas-vivas e, ironicamente uma das mais ameaçadas de extinção, por causa do alto índice de captura incidental pela pesca.
Embarcações, redes de pesca, anzóis, degradação de áreas de desova, fotopoluição e poluição dos oceanos, além das mudanças climáticas, são os principais inimigos das tartarugas marinhas e podem interromper a chance de recuperação das cinco espécies que ocorrem no nosso país. A fibropapilomatose é outra ameaça para esses animais: doença caracteriza por tumores (papilomas) que aparecem na pele com incidência maior nos olhos, pescoço e nadadeiras acabam atrapalhando as tartarugas em sua movimentação, deixando-as debilitadas e até levando-as à morte. Muitos estudos científicos são feitos e existem evidências de que o causador da fibropapilomatose é um agente viral, significando baixa imunidade nas tartarugas.
Podemos dizer que as tartarugas marinhas são importantes seres bioindicadores ambientais em vista de terem um longo período de vida e por ocuparem um nível trófico elevado, tornando-se bioacumuladores de contaminantes.
O ciclo de vida das tartarugas marinhas envolve diferentes ambientes ao longo da vida, o que implica em mudança de hábitos pois embora sejam marinhas, elas utilizam a praia, ambiente terrestre, para desova, garantindo o local adequado à incubação dos ovos e o nascimento dos filhotes. A temperatura da areia é responsável pelo desenvolvimento do embrião dentro do ovo.
Ao nascerem, os filhotes vão se dirigindo para o alto-mar, onde atingem zonas de convergência de correntes que formam grandes aglomerados de algas, principalmente sargaços e matéria orgânica flutuante. Nestas áreas, as tartaruguinhas permanecem por muitos anos com alimento abundante e proteção. Posteriormente vão migrando pelo oceano. Algumas espécies podem permanecer no ambiente pelágico por toda a vida, como a tartaruga de couro. Outras espécies, durante a fase jovem, sobrevivem da alimentação de organismos bentônicos em regiões costeiras ou insulares. Acompanhe aqui a abertura de ninhos e soltura de filhotes.
Em Sabiaguaba, localizada a cerca de 15 Km do centro da cidade de Fortaleza, no estado do Ceará, visitamos a região onde existem focos de eclosão de ninhos e áreas de encalhes desses animais e entendemos a necessidade de um trabalho de educação ambiental. Pena que não estava na temporada de desova!
A praia de Sabiaguaba conta com duas unidades de Conservação Ambiental administradas pela Prefeitura de Fortaleza desde 2006. Tanto a Parque Natural Municipal das Dunas de Sabiaguaba e a Área de Proteção Ambiental de Sabiaguaba foram criadas com o intuito de garantir a preservação ambiental e o turismo ecológico na região.
Foram apresentadas as atividades realizadas pelo projeto “Programa Verde Luz de Gestão Ambiental Sustentável” que englobam a interação com a comunidade local para identificar as principais ameaças para as populações de tartarugas marinhas da região, traçar planos de conservação e conscientização ambiental e até o monitoramento dos ninhos de tartaruga situados entre a foz do Rio Cocó até a foz do Rio Pacoti. Confira aqui a conscientização ambiental dos nativos de Sabiaguaba junto com o EcoMuseu Natural do Mangue.
Agradecemos a XXXI SNO por essa oportunidade e aproveitamos para ressaltar que projetos científicos desse tipo são importantes e fundamentais no âmbito da Oceanografia como forma de alertar a população para a necessidade urgente de proteção do ecossistema marinho não só no Brasil mas pelo mundo a fora.
No Brasil, na década de 80, um grupo de oceanógrafos da Universidade Federal do Rio Grande, numa saída de campo em Atol das Rocas, percebeu a necessidade urgente de conservação do ecossistema marinho: foi o início de um projeto com geração pioneira de ambientalistas no nosso país. Hoje o Projeto TAMAR está presente em 25 localidades no Brasil, em áreas de alimentação, desova, crescimento e descanso das tartarugas marinhas, no litoral e ilhas oceânicas dos estados da Bahia, Sergipe, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina, em parceria com a Petrobras. Já conhece o Projeto Tamar?
Como curiosidade, fica a dica de comemorarmos o Dia Internacional da Tartaruga Marinha, 16 de junho, em homenagem ao nascimento do Dr. Archie Carr que começou a estudar as tartarugas marinhas, na década de 50, em Tortuguero, na Costa Rica, e se tornou um dos mais importantes pesquisadores da área. Seus estudos e escritos são responsáveis por grande parte do que se conhece hoje sobre a biologia e o ciclo de vida desses animais. O “pai” das tartarugas marinhas criou em 1959 o Caribbean Conservation Corporation (atual Sea Turtle Conservancy), o mais antigo grupo de pesquisa e conservação de tartarugas marinhas do mundo. Clique aqui para conhecer esse trabalho.
Maria Gabriella Baptista
Fontes:
Fotos de sites da web