Como as Mudanças Climáticas podem ameaçar as Cidades?

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A partir do início deste século, há 20 anos atrás, o padrão de entrada de frentes frias no Rio de Janeiro vem sofrendo transformações. De maneira geral apesar do avanço das frentes frias serem de sudoeste, esta vem percorrendo trajetórias diferentes transferindo energia para a superfície do mar para a formação de ondas em locais diferentes (pista da área molhada). Estas áreas de transferência de energia entre atmosfera/oceano, estando em locais diferentes, as ondas resultantes podem se propagar com direções diferentes.
Esta mudança de pista faz com que as ondas formadas possam ser mais intensas caso estejam mais próximas do litoral e ao se propagarem, avancem sobre a costa fluminense em situação diferenciada, ou seja, pela direção S/SE mesmo durante o outono/inverno. Antes esse padrão de incidência de ondas no litoral (S/SE) só se observava durante a primavera/verão com ondas mais regulares. Agora, mesmo no inverno existe o cenário de ataque de ondas vindas de S/SE, somado com a maior frequência e intensidade de entrada das frentes frias. Tal situação acarreta numa maior exposição de áreas no litoral fluminense, antes abrigadas, podendo redundar em erosão severa em muitos trechos.

Cyclone Catarina 2004.jpg
Furacão Catrina
fonte: Wikipedia

Assim, além do aumento da intensidade das ondas que se abatem no litoral fluminense em decorrência das pistas de transferência de energia estarem mais próximos à costa, a direção de penetração das ondas também sofreu alterações entre 2001 a 2019.

Força das ondas causou desmoronamento do calçadão na orla da Praia da Macumba, no Recreio Foto: Marcio Alves / Agência O Globo

Antes a direção predominante de entrada das ondas era de Sudoeste. Contudo, agora já ocorrem situações de ataque de ondas provenientes da direção S/SE. Desta forma, surgem novas áreas de exposição do litoral do Rio de Janeiro.

Muitos locais, antes protegidos pelo anteparo que proporciona o afloramento rochoso do Morro do Pão de Açúcar, como a Praia do Flamengo, Marina da Glória e Ilha da Laje no interior da baía de Guanabara, agora ficaram visivelmente mais expostos para ondas provenientes de S/SE que adentram sem qualquer obstrução pela boca da baía.

ressaca na cabeceira do aeroporto Santos Dumont
fonte: Estadão
Barco arrastado até as pedras, na Urca

Neste novo cenário de mudança climática as cidades costeiras ficaram sensivelmente mais expostas a diferentes vetores climáticos como ventos intensos, ondas de ressacas, sobrelevação do nível do mar devido às marés meteorológicas (frente frias), maresia e chuvas volumosas.

As alterações do padrão de ataque destes vetores climáticos redundam em impactos urbanos, nas quais as cidades não foram nem dimensionadas e nem preparadas. Naturalmente que as cidades costeiras devem sofrer estudos mais específicos para estas situações novas de cargas ambientais sobre seu litoral. A tabela a seguir exemplifica a relação entre vetores climáticos e seus efeitos:

Vetores Climáticos Impactos Urbanos
Ventanias Destruição de edificações e Sinalização, Quedas de árvores.
Ondas de ressacas Erosão das praias, Colapso de edificações
Maré Meteorológica Inundação da orla, Salinização do lençol freático
Maresia Deterioração das estruturas, Corrosão
Chuvas Intensas Enchentes, Erosão das encostas, Poluição das águas.
Areia levantada e lixo carregado pelo mar, na ressaca da praia da Barra
foto: Paula Charnaux

Portanto, o cenário preocupante das mudanças climáticas é bastante real e perceptível pela sociedade que mora ao longo do litoral. As cidades litorâneas devem se preparar com antecipação visando evitar a propagação dos prejuízos materiais e, o pior, perdas de vidas que poderiam ser evitadas pelas flutuações dos eventos extremos.

O Rio de Janeiro, cidade de alta visibilidade, pode ser um exemplo bom ou ruim destas consequências em função do nível de lucidez das autoridades responsáveis pela gestão urbana. Exemplos de equipamentos urbanos valiosos como a Ciclovia Tim Maia e a Av. Niemeyer poderiam estar plenamente funcionais e servindo a sociedade se soubéssemos nos antecipar aos sinais de alerta que o mar vem nos mostrando nos últimos 20 anos.

Investimentos urgentes em monitoramento e desenvolvimento de iniciativas inovadoras devem ser realizados para se evitar novas tragédias no futuro. A parceria entre o poder público, iniciativa privada e universidades de pesquisa visando desenvolver tecnologias aplicadas para auxiliar na fixação segura das cidades no litoral devem ser estimuladas. O treinamento de procedimentos e a disseminação de informações para a sociedade, promovendo a sua orientação e participação nas medidas de contingência para sua segurança e mobilização, devem ser implementadas. Finalmente equipamentos de sinalização, dos possíveis locais e tipos de riscos, devem ser promovidos ao longo da orla densamente ocupada.     

Ressaca derruba parte da ciclovia recém-inaugurada da Avenida Niemeyer, na altura da Gruta da Imprensa em São Conrado, duas pessoas morreram. Foto: Custódio Coimbra 21/04/2016 / Agencia O Globo

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