Vírus – Riscos também no Ambiente Marinho

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Chega o inverno e logo começam os espirros, as tosses e os narizes entupidos. Vamos ao médico e frequentemente ouvimos falar sobre infecções virais, como a gripe ou o resfriado. Mais do que isso, passamos por períodos de medo por infecções virais mais sérias, como a chikungunya, zika, a volta da febre amarela e nosso velho problema, a dengue. Os vírus são muito adaptáveis e se espalham das mais diversas formas, seja através do ar, por picadas de mosquitos, troca de fluídos corporais (como a herpes ou DSTs)… mas poucas pessoas se atentam para os oceanos: raramente associamos um dia de praia à uma doença séria como a hepatite.

Mas primeiro, o que são vírus, exatamente? Vírus são seres de estrutura muito simples e extremamente pequenos (apenas visíveis em microscópios eletrônicos, ainda mais potentes que os convencionais). A palavra vírus vem do Latim vírus, que significa fluído venenoso, ou ainda toxina. Esses seres não possuem metabolismo ou meios de reprodução próprios, o que gera uma discussão no meio acadêmico se são seres vivos ou não. Por precisar de células de hospedeiros vivos para sua ação metabólica e multiplicação, eles invadem as células e as obrigam a trabalhar para eles, reproduzindo novos vírus e depois matando a célula que parasitaram. É por isso que nos perturbam tanto e ás vezes causam tantos estragos.

      

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Figura 1 – Estrutura de um vírus e sua reprodução
Fontes: http://williamenatashabioifes.wordpress.com/ e http://www.brasilescola.com)

Nos oceanos, os vírus são responsáveis por funções de controle químico, biológico e até climatológico, sendo essenciais para o equilíbrio da vida e do planeta. Por exemplo, sabe-se que eles ajudam a equilibrar o plâncton marinho controlando a concentração de bactérias presentes nele, já que as parasitam. Eles também afetam o ciclo do carbono no mar, garantindo a reciclagem e movimentação de nutrientes em áreas pouco habitadas e com pouca concentração de carbono. Os vírus também afetam no clima através da liberação do gás sulfato de dimetilo, ou DMS, que ajuda na formação de nuvens e no ciclo do clima de todo o planeta, desde áreas polares a tropicais.

Poluição e os Vírus

Em 2015, ano anterior às Olimpíadas no Rio, a notícia de que as águas da Baía de Guanabara estavam tão poluídas que apresentavam altos riscos para os banhistas olímpicos pôs em cheque a qualidade das águas do Rio de Janeiro e atraiu a esse tema olhar internacional. Na época, os testes feitos em laboratórios americanos indicaram que a quantidade viral nas águas era de 1,7 milhões de vezes maior do que o aceitável para os padrões americanos, e que muitos atletas já haviam apresentado sintomas adversos em contato com a água.

A poluição nesse caso veio do lançamento de esgoto sem tratamento nas águas da Baía de Guanabara, que traziam consigo vários tipos de vírus nocivos à saúde humana na baía. Sabemos, no entanto, que isso não ocorre apenas na Baía de Guanabara. SAIBA MAIS.
O lançamento exorbitante de esgoto e a poluição causa desequilíbrio e aumenta as chances de infecção tanto de humanos quanto de animais marinhos, seja por exposição excessiva a esses agentes patológicos, ou à baixa na imunidade consequente do estresse de ter que lidar e viver em ambiente altamente poluídos.

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Figura 2 – Lixo na Baía de Guanabara e a Regata Ecológica para sua retirada, em 2014. Fonte: Revista Exame / Tomáz Silva

Efeito nos humanos

Os vírus encontrados na Baía de Guanabara no evento citado acima têm origem no intestino humano. A permanência desses tipos de vírus na água pode variar e chegar a anos. Foram encontrados tipos de adenovírus, rotavírus e enterovírus, além de coliformes fecais. Outros vírus, como da hepatite A e E, também sobrevivem na água e são liberados por pessoas doentes nas fezes. As doenças relacionadas a vírus são transmitidas através de consumo de água e alimentos contaminados (inclusive peixes e mariscos contaminados), ou por contato direto com água contaminada em áreas de recreação.

Os sintomas nos humanos variam. Podem ocorrer infecções virais sem que o hospedeiro sinta qualquer sintoma, assim como a sentir enjoos, vômitos, dor abdominal e diarréia. No entanto, doenças como infecções respiratórias, intestinais, estomacais e gastroenterites também ocorrem. Em casos mais raros e graves, doenças cerebrais, paralisia, problemas cardíacos, meningite, encefalite e hepatite também são possíveis.

Algumas dessas doenças podem causar a morte do infectado, ou causam sequelas graves para órgãos vitais. O tratamento de muitas é demorado e de alto custo. Dessa forma, é melhor remediar e evitar contato com qualquer praia, rio, lago ou lagoa altamente poluído.

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Figura 3 – Esgoto a céu aberto formando língua negra na praia de Areia Preta – RN. Fonte: Eduardo Maia / RioGrandedoNorte.net

 Efeito nos animais

Vírus são uma grande causa de mortalidade também no oceano, e seus alvos vão desde camarões minúsculos até gigantescas baleias. Afetando todos os tipos de seres vivos, eles provocam doenças, muitas delas conhecidas por afetar também os seres humanos. Normalmente, essas doenças afetam os animais maiores quando a concentração viral no meio está muito alta, e se alastram em populações que já se encontram em algum tipo de estresse ecológico.

Um caso muito comentado há algum tempo foi a infecção viral de camarões cultivados aqui no Brasil, chamada de Doença da Mancha Branca. Causado por um vírus pertencente ao gênero Whispovirus  e da família Nimaviridae, este deixava os camarões repletos de pequenas manchas esbranquiçadas pelo corpo. Casos assim afetam indiretamente os seres humanos: eles não apresentavam riscos para a saúde humana, porém afetava o lado comercial, devido a seu aspecto visual quando contaminado pelo vírus. Espécies de vírus como essa podem causar grandes estragos para a aquacultura.

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Figura 4 – Camarão infectado pela Doença da Mancha Branca
Fonte: Á esquerda: Instituto Biológico da USP/ à direita: http://tudo.criacaodepeixes.com/doenca-da-mancha-branca-em-camaroes/

Outro exemplo de infecção viral seria a infestação de vírus da herpes em tartarugas, principalmente em tartarugas-verdes, animais que povoam a Terra há mais de 100 milhões de anos e que encontram-se atualmente em perigo de extinção. A doença a qual o vírus está associado, chamada de “fibropapilomatose”, vem dizimando populações de tartarugas, formando tumores seus corpos. Uma das principais causas seria a baixa imunidade desses animais devido a deterioração de seus habitats naturais e pela falta de alimento, facilitando a entrada do vírus. Apesar da natureza da doença ainda não ser totalmente conhecida, o herpes-vírus está associado à fibropapilomatose na grande maioria os casos registrados.

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Figura 5 – Tartaruga com fibropapilomatose. Fonte: Centro de Estudos de Venenos e Animais Peçonhentos da UNESP – Peter Bennett & Ursula Keuper-Bennett

Quando os tumores são externos, eles permitem uma sobrevida a esses animais. Porém, logo os deixam cegos, incapacitando-os de desviar de obstáculos, de fugir de predadores e de procurar alimentos, matando-os de fome ou pela predação. Já quando os tumores são internos, a pressão e obstrução dos órgãos desses animais não demoram a matá-los. O vírus, que pode ficar incubado por meses e até anos e é altamente contagioso entre as tartarugas, assim como ocorre nos seres humanos, aparecem em situações estressantes, que é exatamente a situação que essas tartarugas se encontram.

Outros casos estão começando a surgir, como a morte de corais e uma grande suspeita dos cientistas de que seja por doenças virais, novamente com o herpes-vírus. Esses eventos ocorrem em abundância no meio marinho, já que os hospedeiros e vítimas de invasões virais não podem fazer nada contra a doença que os agride.

Por isso é muito importante o estudo dessa área. Muitas espécies de vírus são ainda desconhecidas no ambiente marinho e poderiam afetar os seres humanos, e estaríamos muito pouco preparados para elas. Os maiores exemplos de despreparo foram os casos de surtos citados no começo desse artigo: zika e chikungunya.

A diminuição dessas ocorrências depende da preservação e da recuperação das áreas ambientais afetadas. O saneamento básico (industrial e doméstico) em áreas de influência de corpos d’água eutrofizados ajudam muito na diminuição de lançamento de vírus nos oceanos e do impacto que eles podem causar. O lixo que jogamos nas praias também é bastante prejudicial, já que causa estresse nos animais marinhos e aumenta os riscos de infecção pela baixa imunidade. Não podemos esquecer que vírus podem ser altamente contagiosos, e assim causar enormes perdas ecológicas e ambientais e, futuramente, até humanas.

Por Natália da Silva Menezes

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